Dia Mundial dos Oceanos: por que o agro depende de mares limpos

Você já parou para pensar qual a sua relação com o oceano? Mesmo se vive em um local distante do litoral, o seu cotidiano está ligado ao mar. Ele é responsável, por exemplo, por mais da metade do oxigênio que cada ser humano respira. Quando se trata da atividade agropecuária, não é diferente.

“Ter o oceano limpo é demanda do agro, pois esse é um setor totalmente influenciado pelo clima que, por sua vez, é influenciado pelo oceano”, afirma Ronaldo Christofoletti, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e representante brasileiro na Agência das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) para a cultura oceânica.

Christofoletti lembra que as mudanças climáticas são consequências diretas de alterações nas temperaturas dos oceanos. Calor acima da média, frio e chuvas em excesso, que podem gerar de efeitos leves a devastadores à agropecuária, estão ligados à conservação dos mares.

“Tanto o El Niño quanto a La Niña são fenômenos que podem alterar a produção agropecuária e até mesmo o PIB [produto interno bruto] dos países”, ressalta o professor.

O aumento da temperatura do oceano também muda a vida marinha, tornando mais difícil a sobrevivência de muitas espécies. A ação humana também ameaça a presença do maior estoque de carbono do planeta, que está nos oceanos, conforme a ONU Meio Ambiente.

No clima e no comércio

Além da questão climática e suas consequência sobre a produtividade das lavouras, o mar é fundamental no comércio do agro. Um oceano seguro contribui para a eficiência do transporte marítimo – responsável por mais 95% do escoamento do comércio exterior brasileiro, conforme a Marinha do Brasil.

Christofoletti observa que redes e equipamentos de pesca, peças de descarte das comunidades e dos próprios navios em mar aberto podem causar problemas e aumentar os riscos para a navegação, incluindo acidentes ou danos para embarcações.

“Olhamos pouco para essa relação, mas dados da Marinha apontam que o maior impacto para os grandes navios são redes de pesca soltas no oceano, as chamadas redes fantasma”, destaca. E adverte: “E um navio parado pode gerar um prejuízo enorme”.

‌O agro sustentável e os mares

O aumento de poluentes é outra preocupação. O professor da Unifesp chama a atenção para a necessidade de uma utilização cada vez mais responsável de defensivos agrícolas no campo. Christofoletti reforça que é preciso reduzir o uso de produtos químicos, uma vez que tudo que é absorvido pelo lençol freático vai parar no oceano.

Da mesma maneira, o descarte inadequado de embalagens plásticas prejudica a vida marinha e também pode contaminar os peixes e os frutos do mar. “Muitos animais marinhos responsáveis por filtrar a água do mar acabam absorvendo os microplásticos”, alerta. “A agricultura sustentável é uma oportunidade que o produtor tem de ter esse olhar para o oceano também”, acrescenta.

Entre os benefícios de uma atividade agropecuária sustentável, o professor enumera a estabilidade do solo, o que pode resultar em melhorias na qualidade do oceano e no equilíbrio do clima. Ele acredita que uma das soluções é o investimento em tecnologia e inovação, para garantir cada vez menos impacto ao meio ambiente e aos corpos d’água.

Nesse aspecto, ele destaca o uso de sistemas produtivos como a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Ressalta ainda o papel fundamental de pequenos agricultores e aquicultores, que, além de contribuírem com a segurança alimentar, ajudam a manter um oceano estável: “não tem verde sem azul e vice-versa”, exemplifica.

A sustentabilidade, inclusive, aparece entre as 8 megatendências mapeadas pela Embrapa na plataforma online Visão de Futuro. Nesse âmbito, é destacado o aumento da pressão pelo uso e conservação dos recursos naturais – solo e água. São sinalizados aspectos como sistemas agrícolas mais sustentáveis e a bioeconomia com foco nos resíduos da agroindústria, assim como o fortalecimento da economia verde.

Década do Oceano

Com o intuito de disseminar informações e reverter o ciclo de declínio na saúde do oceano, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou de 2021 a 2030 a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável. Segundo professor da Unifesp e integrante da Unesco, a proposta é adotar uma ciência transformadora, não só acadêmica, mas que agrega o conhecimento tradicional das comunidades e das gerações.

Aqui no Brasil, foi criado um plano nacional que prevê melhorias de gestão e governança, assim como ações prioritárias identificadas em consulta à sociedade. “É preciso formar uma aliança com toda a sociedade, associações, federações, produtores, indústrias, portos”, elenca.

Entre os aspectos, estão ações voltadas a um oceano limpo, onde as fontes de poluição estejam identificadas e sejam reduzidas ou removidas; um oceano saudável e resiliente, onde os ecossistemas marinhos sejam compreendidos, protegidos, recuperados e devidamente geridos; e um oceano produtivo, que suporte uma cadeia alimentar sustentável e uma economia oceânica sustentável.

A agricultura sustentável é uma oportunidade que o produtor tem de ter esse olhar para o oceano também”
— Ronaldo Christofoletti, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

Para isso, o comitê nacional de implementação das ações da Década do Oceano quer reunir dados da academia e dos setores público e privado, respeitando as particularidades de cada região do país, e propor o desenvolvimento de ações e projetos.

Entre as ações prioritárias está o mapeamento e desenvolvimento da infraestrutura física e logística sustentável, incluindo o financiamento, gestão de dados, informações, tecnologias e inovações para a ciência oceânica e gestão costeira e marinha.

“É uma década de escuta, que será construída com a participação de todos e que demanda que cada um faça a sua parte. O desenvolvimento sustentável só será possível quando cada um entender a conexão e promover a mudança de comportamento”, avalia Christofoletti.

Informações do Globo Rural.
Fotos: Reprodução

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